A Decisão do STJ sobre a Nulidade do Seguro D&O em Casos de Atos Dolosos: Análise Jurídica e Repercussões
Introdução
A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) consolidou um entendimento relevante para o direito securitário e corporativo ao negar o pagamento de indenização de seguro Directors and Officers (D&O) a uma empresa cujos dirigentes praticaram atos dolosos durante a gestão.
O caso, julgado sob o REsp nº 2.149.053-SP, reforça a premissa de que a cobertura securitária não pode servir de escudo para condutas criminosas ou fraudes intencionais, destacando a importância da boa-fé contratual e da transparência nas relações jurídicas.
Contexto do Caso e Fundamentação Legal
A empresa recorrente havia contratado um seguro D&O para proteger seus administradores contra ações de responsabilidade civil decorrentes de atos de gestão.
Contudo, omitiu informações cruciais durante a contratação, como investigações em curso pela Securities and Exchange Commission (SEC) nos EUA, relacionadas a práticas fraudulentas e acordos que reconheciam lucros ilícitos 234. O STJ, seguindo o voto da ministra Nancy Andrighi, aplicou os artigos 762 e 766 do Código Civil:
- Art. 762: Declara nulo o contrato de seguro se o sinistro resulta de ato doloso do segurado ou beneficiário.
- Art. 766: Permite à seguradora negar a cobertura se houver omissão ou declarações falsas que influenciem na avaliação do risco.
A decisão ressaltou que o seguro D&O cobre apenas atos culposos (erros não intencionais), excluindo condutas dolosas, como corrupção e fraudes financeiras. A empresa, ao omitir investigações e acordos com a SEC, violou o dever de informação, essencial para o cálculo do prêmio e a validade do contrato.
Doutrina e Princípios Jurídicos Relevantes
- Princípio da Boa-Fé Objetiva: A omissão de informações relevantes configura violação deste princípio, que permeia as relações contratuais. Como destacado pela doutrina de Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona, a transparência é pilar essencial nos contratos de seguro, sobretudo em apólices de alto risco como o D&O.
- Função Social do Contrato: A decisão alinha-se à visão de que o seguro não pode incentivar ou proteger ilicitudes. Para Cláudia Lima Marques, a finalidade do seguro D&O é proteger gestores de erros técnicos, não de crimes.
- Teoria do Risco: O STJ reiterou que o risco coberto deve ser lícito e imprevisível. Atos dolosos, por serem intencionais, fogem à lógica securitária, conforme ensinamentos de Sérgio Cavalieri Filho.
Direito Comparado e Cláusulas de Severabilidade
Em direito comparado, países como EUA e Reino Unido adotam cláusulas de severability (ou innocent directors clause), que isolam a responsabilidade de administradores individuais em casos de dolo.