Filhos Reproduzidos Post Mortem e Vocação Sucessória: Desafios e Perspectivas na Jurisprudência e Doutrina
Introdução
A evolução científica e tecnológica, especialmente no campo da reprodução assistida, tem desafiado o Direito a repensar conceitos tradicionais, como os limites da vocação sucessória.
A possibilidade de obtenção de filhos por meio de técnicas de reprodução post mortem – isto é, a utilização de gametas do falecido para a procriação após sua morte – suscita intensos debates doutrinários e judiciais.
Este artigo examina, à luz da doutrina nacional e internacional comparada, os impactos da reprodução post mortem na vocação sucessória, com especial atenção à proteção dos direitos dos futuros filhos e à interpretação das normas sucessórias. A análise é enriquecida com a discussão de recentes decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
1. Aspectos Jurídicos da Reprodução Post Mortem e a Vocação Sucessória
A reprodução post mortem consiste na utilização de gametas – geralmente espermatozoides, e, em alguns casos, óvulos – de uma pessoa falecida para gerar um filho, mediante técnicas de reprodução assistida.
Este instituto levanta complexas questões jurídicas, especialmente quanto à eficácia dos atos jurídicos realizados após a morte e à formação do vínculo jurídico necessário para o reconhecimento da filiação.
No campo do Direito Sucessório, a vocação sucessória do descendente é tradicionalmente condicionada à existência de um vínculo jurídico e biológico com o falecido, que se inicia com a concepção ou, pelo menos, com o reconhecimento do vínculo legal.
Assim, a discussão central reside em saber se os filhos obtidos por meio de reprodução post mortem podem ser considerados herdeiros legítimos, com direito à sucessão, mesmo que sua concepção ocorra após a morte do progenitor.
2. Doutrina Nacional
Na doutrina brasileira, há posições divergentes acerca do reconhecimento dos direitos sucessórios dos filhos reproduzidos post mortem.
Para Maria Helena Diniz:
Filiação é o vínculo existente entre pais e filhos; vem a ser a relação de parentesco consangüíneo em linha reta de primeiro grau entre uma pessoa e aqueles que lhe deram vida, podendo ainda (CC, arts. 1.593 a 1.597 e 1.618) ser uma relação socioafetiva entre pai adotivo e institucional e filho adotado ou advindo de inseminação artificial (DINIZ, 2015, p. 503-504).
Autores como Maria Berenice Dias e Rodrigo da Cunha têm abordado a questão sob a ótica da proteção da dignidade da pessoa humana e da igualdade entre os descendentes.
Maria Berenice Dias sustenta que: