“a vocação sucessória não pode ser cerceada por formalismos que desconsiderem o princípio da dignidade da pessoa humana, o qual impõe a proteção dos frutos da vida, independentemente do momento da concepção” (DIAS, 2018).
Já Rodrigo da Cunha enfatiza que “a utilização de técnicas de reprodução post mortem impõe ao legislador e ao Judiciário o desafio de adaptar os conceitos tradicionais de filiação e sucessão a uma realidade científica e social em transformação” (DA CUNHA, 2019).
A discussão gira em torno de dois pontos centrais: a constituição do vínculo jurídico (filiação) e o momento do nascimento como marco temporal para o início dos efeitos sucessórios.
A tendência majoritária na doutrina aponta para a necessidade de uma interpretação ampliativa dos direitos sucessórios, de modo a incluir os filhos gerados post mortem, desde que comprovada a intenção do falecido em permitir tal procedimento e a existência de vínculo biológico ou jurídico.
3. Perspectiva Internacional Comparada
No cenário internacional, os debates sobre a reprodução post mortem e a vocação sucessória apresentam nuances diversas, conforme o ordenamento jurídico de cada país.
Na Alemanha, por exemplo, a legislação e a jurisprudência têm avançado no sentido de reconhecer os direitos dos filhos nascidos de gametas post mortem, desde que haja consentimento prévio expresso do falecido.
O princípio da proteção da personalidade e o interesse superior da criança têm sido argumentos centrais nesse contexto.
Nos Estados Unidos, a abordagem é bastante heterogênea, variando de acordo com o Estado.
Alguns tribunais têm reconhecido os direitos sucessórios dos filhos nascidos por meio de reprodução post mortem, enfatizando que “o direito de uma criança de existir e ser reconhecida como descendente não pode ser desconsiderado por peculiaridades técnicas do momento da concepção” (Smith, 2020).
Essa tendência comparada corrobora a ideia de que a proteção dos direitos fundamentais e da dignidade humana deve se sobrepor a formalismos processuais que possam excluir esses filhos da sucessão.
4. Jurisprudência do STF e do STJ
4.1. Supremo Tribunal Federal (STF)
O STF, em algumas de suas decisões recentes, tem demonstrado uma postura favorável à proteção dos direitos dos filhos obtidos por reprodução post mortem, ressaltando que os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e da proteção à família não podem ser ignorados.
Essa decisão reflete a tendência de interpretação que visa assegurar os direitos sucessórios dos filhos, mesmo em contextos não tradicionais.